8/06/2006

A Urologista


Capitulo 1

Onde a dor é dilacerante

Não era muito chegado a médico. Nem tampouco a doenças. Evitava até falar a palavra para não atrair. Mas a ardência na hora de tirar água do joelho estava passando de todos os limites. Temia até, absurdo, tomar a sagrada cervejinha com os amigos. Esse inocente hábito agora representava algumas sessões de tortura no intervalo da resenha. Mas não podia e não ia ficar refém do medo, decidiu encarar o problema.

Ia lá sim, mostrar o centroavante matador pro doutor e voltar à normalidade de bate-papo na boemia com os chagados do bairro.


Tava decidido, assim que amanhecesse ligava de um orelhão e marcava a consulta.

Dormiu mal aquela noite. O calor fez esquecer da ardência e bebeu grandes 2 litros d’água antes de puxar o ronco. Se arrependeu ardidamente. Quando o despertador acusou 6 horas, já tinha contado 3 idas ao banheiro e uma ameaça de mijada com requintes de crueldade. Aquilo era pior do que ir ao temido Dops.

Tomou café, um menorzinho para não inchar a bexiga, e comeu um pão integral e uma maçã, evitando assim piorar o quadro. Abriu as páginas amarelas, folheou até a seção de médicos, correu as vistas mais um pouco e encontrou a especialidade procurada – urologistas. Correu o dedo na lista e fez papai-do-céu mentalmente. Encontrou um nome: Doutor Fernando Correia Barros. Discou depressa e comprimiu a bexiga de encontro ao acento para diminuir a dor, que voltava. Apertou a medalhinha de Santo Expedito e pediu ajuda.

Um, dois, três, quatro toques e nada. Caiu na caixa. Resolveu tentar outro. Não podia se dar ao luxo de escolher médico naquele estado.


A dor era dilacerante. Não resistiu e deixou a lista cair ao chão. Chorou e chamou por Nossa Senhora prometendo que largaria a cerveja por uma semana se saísse daquela. Calculou que seria mais ou menos esse o tempo de tratamento. O otimismo é o que cura o homem, pensou. Respirou fundo.Pegou a lista do chão, correu o dedo novamente e encontrou outro nome: doutor Lucimar Cardoso Ferreira. Discou com a mão trêmula e no segundo toque atenderam.


- Consultório da douto....
- Minha filha, minha querida, por favor, é caso de urgência. Me vê uma consulta com Doutor Lucimar aí o quanto antes. Acho que tô com infecção urinária grave.
- Pois não senhor, temos um horário em aberto às 10 horas.
- Pra mim está ótimo, confirma aí. Se puder até ser antes.
- Infelizmente senhor, só temos esse horário hoje.
- Tudo bem então, pode confirmar.
- Qual o seu convênio senhor?
- Quero particular.
- Seu nome completo?
- Oswaldo Guido Souza.
- Prontinho Sr. Oswaldo, está marcado às 10 horas com a douto...
- Obrigado minha filha. Tchau.
Desligou e correu pro banheiro para mais uma sessão de tortura.


(continua)